Brasil aposta em recuperação de áreas degradadas para dobrar a produção do agro sem desmatar
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Não apenas de ambientalistas, diplomatas e governantes é feita a Conferência do Clima das Nações Unidas (COP28), que começa nesta quinta-feira (30) em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. O evento é um ponto de encontro de empresários e lobistas dos mais diversos setores da economia. Na delegação brasileira, o agronegócio comparece em peso para tentar dar uma nova imagem à produção agrícola do país – associada, nos últimos anos, ao desmatamento e à devastação do patrimônio natural.
Esse impulso virá do próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que deixou para anunciar na COP os detalhes de um plano recém lançado pelo Ministério da Agricultura e Pecuária para recuperar áreas degradadas e improdutivas. Tratam-se de 40 milhões de hectares de terras utilizadas para pastagens, pela pecuária, e que possuem “alta aptidão para a agricultura” se fossem reabilitadas para o plantio.
O objetivo se inscreve na promessa do governo de aumentar a produtividade brasileira sem derrubar mais florestas – principal calcanhar de Aquiles do Brasil na área ambiental.
Conforme estimativas do ministério, o país tem cerca de 150 milhões de hectares de áreas degradadas que servem a pastagens – ou mais de duas vezes o território de um país como a França. A maior parte delas, cerca de 60%, ficam no Cerrado.
“Não pode ter apenas uma cabeça de gado por hectare. Com tecnologia, assistência técnica, financiamento correto, poderá se ter três ou duas cabeças”, disse a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, ao depor a uma comissão no Senado nesta segunda-feira, antes de viajar a Dubai. “Não precisa nem ser um sistema intensivo, basta ser semi-intensivo e a gente dobra a produção sem precisar avançar sobre os ativos ambientais do nosso país”, argumentou.
Contribuição do Brasil conta com recuperação de áreas degradadasNo âmbito do Acordo de Paris sobre o Clima, o país se comprometeu a recuperar 15 milhões de hectares de pastagens degradadas até 2030 – o que permite evitar mais desmatamento. A meta faz parte da Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês) do Brasil, as ações que cada país apresenta para limitar as suas emissões de gases de efeito estufa, que provocam o aquecimento do planeta.
O Plano Setorial para Adaptação à Mudança do Clima e Baixa Emissão de Carbono na Agropecuária 2020-2030, adotado em 2021, visa dobrar esse objetivo, chegando a 30 milhões de hectares.
“Uma pastagem bem manejada, recuperada, com alto vigor produtivo, sequestra carbono, em vez de emitir. Então é uma grande oportunidade para toda a agenda climática do Brasil e tendo o setor agropecuário como um protagonista”, disse à RFI Leila Harfuch, economista especialista em sustentabilidade no agronegócio e sócia-gerente da Agrícone.
Ela lembra que o Plano Safra já direciona recursos para práticas de menor impacto ambiental, via Plano ABC (Agricultura de Baixo Carbono). A demanda por linhas de crédito como o Renovagro, de R$ 7 bilhões, é crescente. “Isso pode ser revolucionário para o Brasil. É algo bastante interessante.”
Investimento é altoNum prazo de 10 a 15 anos, o governo pretende investir US$ 120 bilhões (cerca de R$ 587 bilhões) no projeto e expandir a área agrícola brasileira de 65 para 105 milhões de hectares, sem desmatar. Linhas de financiamento do BNDES, do Fundo Soberano Brasileiro e do Banco do Brasil devem ser alocadas para os produtores interessados em comprar ou arrendar terras improdutivas e melhorar a gestão da produção, com insumos menos agressivos, técnicas mais sustentáveis de plantio e aumento da rastreabilidade da cadeia, uma exigência do mercado europeu.
“É caro tanto recuperar quanto converter essas pastagens para a agricultura. É uma série de operações agrícolas que precisam acontecer para recuperar o vigor e a fertilidade do solo, e o processo de maturação é longo, de em média cinco anos para o investimento retornar para o produtor”, ressalta Harfuch.
“E também tem uma questão de escala produtiva: uma coisa é o produtor exportador fazer essa conversão, e outra é o pequeno produtor, que vai precisar avaliar bem o investimento, porque nem sempre é viável. Ele teria que ter alternativas como diversificação de produção, por exemplo”, assinala.
No plano do governo, que Lula deverá apresentar para o mundo na COP28, investidores privados externos também poderiam contribuir para o futuro fundo. O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, está entre os 12 ministros que participarão do evento – um recorde.
A participação brasileira promete ser a maior da COP – com 2,4 mil pedidos de credenciamento, entre governo, sociedade civil, pesquisadores e setor privado.