Rumo à eletrificação da economia, Europa acelera abertura de minas de lítio

Rumo à eletrificação da economia, Europa acelera abertura de minas de lítio

RFI Brasil
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Num contexto em que quase metade do lítio mundial é produzido em minas australianas, um terço vem de lagos salgados do Chile e 15% tem origem chinesa, a Europa busca garantir a sua soberania no abastecimento do metal. Enquanto o mundo começa a discutir o fim da era do ouro negro – o petróleo –, agora é o ouro branco, como vem sendo apelidado o lítio, que atiça o apetite dos industriais.

Leve, altamente condutor de eletricidade, a commodity é essencial para a fabricação de carros elétricos, em plena transição energética. Estima-se que Portugal tenha as maiores reservas europeias. A França também se posiciona nessa corrida: uma das maiores minas da Europa deve sair do solo na região de Allier, no centro do país.

O geólogo Benjamin Barré, da mineradora francesa Imerys, recebeu a reportagem da RFI. “Estamos na fase da galeria piloto, que nos permitirá alimentar a usina piloto para terminarmos os nossos testes em escala semi-industrial”, explicou, à repórter Justine Fontaine.

Por enquanto, a poucas centenas de metros do pequeno vilarejo de Echassières, o que se vê é uma grande cratera de onde se extrai caulim, uma rocha quebradiça usada para fabricar porcelana. Mas as obras para a extração do lítio sob a pedreira estão em andamento. O investimento previsto até 2028 é de mais de €1 bilhão, incluindo a extração, a trituração e o refino.

“Na França, acho não houve abertura de uma mina nos últimos 50 anos. Faz muito tempo que não descobrimos uma reserva como esta que nós temos aqui. Podemos dizer que tivemos sorte de chegar a ela, que se encontra embaixo de um local já conhecido e que deve nos permitir, de acordo com o que sabemos até agora, produzir 34 mil toneladas de hidróxido de lítio por ano, durante pelo menos 25 anos”, complementa Vincent Gouley, diretor de Comunicação e Desenvolvimento Sustentável para projetos de lítio da Imerys.

“Isto corresponde às necessidades de lítio de 700 mil veículos elétricos por ano, ou seja, metade da produção francesa atualmente. Ou seja, é um depósito significativo em nível francês e europeu”, diz ele.

Explosão da demanda

A Agência Internacional de Energia (AIE) avalia que a procura por lítio vai crescer 25 vezes até meados do século, estimulada por medidas como a proibição dos carros com motores térmicos na Europa, a partir de 2035. Mais de 30 usinas de fabricação de baterias elétricas estão sendo construídas no bloco e para atender à demanda por lítio, os projetos de minas existentes hoje já serão insuficientes para chegar até 2030, antecipa a agência.

É por isso, para além das reservas, os países europeus também buscam se aperfeiçoar em toda a cadeia de produção. Em Lauterbourg, na fronteira franco-alemã, a start-up Viridian pretende realizar uma das etapas intermédias entre as minas e as fabricantes de baterias eléctricas – o refino. O projeto obteve €12 milhões em subsídios públicos, revela um dos seus cofundadores, Rémy Welschinge.

“O processo começa com o produtor de lítio, que extrai o metal do solo ou da rocha, como vemos muito na Austrália, ou da salmoura, no caso chileno. Depois é preciso refinar. Alguns produtores fazem isso sozinhos, outros preferem enviá-lo para refinarias independentes, para processá-lo ou purificá-lo ainda mais”, aponta Welschinge. “É esse lítio que é fornecido aos fabricantes de eletrodos, para a construção das células de bateria que serão colocadas em veículos elétricos.”

Em 2022, a Comissão Europeia lançou uma nova legislação sobre matérias-primas críticas para facilitar a busca pela soberania no metal e em outros minerais essenciais para a transição energética – baseada, em grande parte, na eletrificação da economia. De quebra, também visa a menor dependência do petróleo e gás da Rússia, no contexto da guerra contra a Ucrânia, e das baterias chinesas.

Risco ambiental

Nas fronteiras europeias, além de França e Portugal, Alemanha, Espanha e Finlândia também se mobilizam em busca de lítio, além do vizinho Reino Unido. Mas apesar do interesse econômico dos países na expansão do setor, os projetos nem sempre são bem-vindos, em especial os ambientalistas. Nas estradas ao redor da planta administrada pela Imerys em Echassières, por exemplo, membros de uma associação pintaram mensagens de oposição ao projeto. Xavier Thabarant evoca o impacto ambiental para a biodiversidade e o uso excessivo de água para a construção da mina: 2,5 milhões de metros cúbicos até a abertura da estrutura, o equivalente ao consumo de 50 mil franceses em um ano.

“É verdade que temos lítio aqui, e talvez tenha alguns outros minérios raros. Mas para fazer uma bateria também precisamos de cobalto, manganês. O cobalto sabemos que é produzido no Congo, então temos, talvez, metade do que precisaremos. Com isso nunca teremos independência energética”, alega.

Com impactos ambientais mais limitados, a extração de lítio por geotermia é outra pista explorada pelos europeus – 10 projetos já tomam formam no vale do Reno, entre a França e a Alemanha, em cujo subsolo foi descoberto o metal. O mais ambicioso deles, capitaneado pela startup australiana Vulcan, já levantou € 400 milhões de euros em investimentos, de um total de € 1,5 bilhão estimado. A meta é chegar 24 mil toneladas e lítio por ano, a partir de 2026.