Governo de Cabo Verde apostado nas privatizações
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O Coordenador da Unidade de Acompanhamento do Sector Empresarial do Estado, Sandeney Cabral Fernandes, pormenorizou à RFI a agenda de privatizações a ser implementada pelo governo de Cabo Verde, com destaque para a privatização da CV Handling.
O Governo de Cabo Verde quer reduzir a presença do Estado em 9 empresas públicas, através da agenda de privatizações, concessões e parcerias público-privadas, processos que devem ser concluídos até o final do primeiro semestre do próximo ano.
O executivo de Ulisses Correia e Silva justifica as privatizações, concessões e parcerias público-privadas como “ferramentas chaves para a potenciação da transformação dos mais variados sectores de actividade da economia nacional, através da atracção de investimento privado com alargada experiência, capacidade de inovação e de acesso a fontes expressivas e atractivas de financiamento”.
A RFI conversou com o Coordenador da Unidade de Acompanhamento do Sector Empresarial do Estado, Sandeney Cabral Fernandes, sobre a agenda de privatizações a ser levada a cabo pelo governo de Cabo Verde, com destaque para a privatização da CV Handling, cujo processo de privatização foi lançado no dia 20 de Fevereiro passado e manifestação de interesse vai até 25 de Março de 2024.
Sandeney Cabral Fernandes, explicou que a privatização da CV Handling está ancorada no propósito do Governo de Cabo Verde, que elegeu o modelo de crescimento e desenvolvimento económico assente na economia de mercado.
“Tal mudança tem permitido ao sector privado ganhar dimensão na economia nacional, acordada em medidas de política económica pró-privado. Cabo Verde tem hoje um bom ecossistema para o financiamento, um bom quadro fiscal e um bom ambiente de negócios. O Estado tem sido criador de oportunidades, para que os privados possam investir em todo o Cabo Verde e em todas as áreas de negócios. Acreditamos que só assim teremos condições para criar empregos bem remunerados, sustentáveis e que possam impulsionar o crescimento económico, com oportunidades para todos. Isto só é possível com o sector privado."
Para a melhor perceção, quando olhamos para a performance histórica da economia cabo-verdiana, pode-se concluir que o modelo económico assente na economia de mercado tem produzido bons resultados, reconhecidos pelos parceiros para o desenvolvimento sustentável de Cabo Verde, tendo por base as seguintes evidências: Nos primeiros anos de Cabo Verde como país independente, com uma economia marcada pela forte presença do Estado, o PIB real cresceu a uma taxa média de 3,2%; Com a abertura económica, a economia teve dinâmica média de 7,4%, tendo sido suportada nas reformas que levaram à nova configuração do modelo de oferta e procura ancorado no turismo, um sector liderado pelo sector privado, como o motor de desenvolvimento económico.
A partir de 2001 a dinâmica económica foi num ritmo menos acelerado, com performance bastante aquém da que teve os nossos pares como Maurícias e Seychelles que registaram um crescimento médio à volta de 5% no pós-crise da crise financeira global. Tal dinâmica, fez com que o rácio da dívida cabo-verdiana tenha atingido os 127,8% do PIB, em 2015.
Pese embora a crise pandémica, que colocou a economia cabo-verdiana em recessão histórica de 20,8% em 2020, a recuperação foi surpreendente e também histórica, tendo sido de 17,7% em 2022. Os dados evidenciam que, desde 2016, a economia nacional tem sido estável, com crescimento médio em torno de 5%.
A dinâmica da actividade económica mundial deverá estabilizar em 3,1% em 2023 e 2024. Mas a nível nacional, o Outlook do FMI, aponta que as perspetivas para o país são favoráveis, com previsão de crescimento médio de 4,6%, de 2024 a 2028. A dívida pública, que era de 127,8% do PIB em 2015, tendo sido de 124,1% em 2019, atingiu 151,2% em 2021 por conta da crise pandémica.
A boa gestão das finanças públicas tem conduzido a uma dinâmica bastante positiva do rácio da dívida pública, com os dados, no 4º trimestre de 2023, a apontar para um stock de cerca de 113,9%, contra 125,7% registado em 2022, ou seja, um decréscimo de 11,8 p.p.
Entretanto, a economia cabo-verdiana comporta riscos, que devem ser identificados e mitigados para que as perspetivas económicas não venham a ser desfavoráveis diante da materialização de tais riscos. Uma das fontes de riso macro fiscal é o Sector Empresarial do Estado, razão pela qual tem sido consensual a necessidade de se avançar com a reforma deste Sector, através de uma agenda de privatização, alienação parcial, concessão ou Parceria Público-Privada (PPP) das empresas públicas, tendo como um dos objectivos: a introdução de novas dinâmicas económicas, através de novas oportunidades de negócio e investimentos para o sector privado, alavancando desta forma sectores chaves e, simultaneamente, reduzir o risco fiscal e orçamental.
É neste quadro que entra a privatização da CV Handling, como parte da reforma do Sector Público Empresarial do Estado.
Quais as expectactivas com a privatização da CV Handling tendo em conta a Zona Especial da Economia Aérea (ZEEA) ancorada ao Hub Aéreo do Sal?
"Cabo Verde deve tudo fazer para tirar partido da sua localização estratégica no Atlântico Médio, fomentar a conectividade interna e com os principais Hubs aéreos do Mundo, igualmente com os países da diáspora e emissores de turistas. A Zona Especial da Economia Aérea (ZEEA), ancorada ao Hub Aéreo do Sal, irá atrair interesses de companhias aéreas internacionais a desenvolverem negócios nas diferentes áreas e a proporcionarem a conectividade aérea com os principais Hubs do mundo, contribuindo para o crescimento do mercado de assistência em escala. A actividade turística deverá expandir-se e atingir cerca de 3 milhões de turistas em 2030, impulsionando a demanda dos serviços aeroportuários; A dimensão do mercado de assistência em escala terá crescimento em torno de 74% e 83%, respectivamente, face a 2023, a nível de passageiros embarcados e de aeronaves recebidas nos aeroportos. Será fundamental existir no país um serviço de handling moderno, competitivo, eficaz e robusto, por forma a dar resposta à procura dos serviços de assistência em escala. A actividade turística deverá expandir-se e atingir cerca de 3 milhões de turistas em 2030, impulsionando a demanda dos serviços aeroportuários. A dimensão do mercado de assistência em escala terá crescimento em torno de 74% e 83%, respectivamente, face a 2023, a nível de passageiros embarcados e de aeronaves recebidas nos aeroportos. Será fundamental existir no país um serviço de handling moderno, competitivo, eficaz e robusto, por forma a dar resposta à procura dos serviços de assistência em escala."
De acordo com o modelo regulatório do sector de assistência em escala, o sector deverá permanecer com um único operador até atingir, individualmente por aeroporto o seguinte tráfego anual: movimentação igual ou superior a 2.000.000 de passageiros embarcados; ou movimentação de 25.000 toneladas de carga. Isto é apresentado como atractivo?
"Sim, estamos a falar de mercado e estabilidade, variáveis essenciais para qualquer investidor, como forma de garantir retorno dos investimentos."
Os sindicatos que representam os trabalhadores da CV Handling estão preocupados com a falta de informações junto dos colaboradores desta empresa. Na sexta-feira passada, num encontro com o Secretário de Estado das finanças e o senhor enquanto coordenador da unidade do sector empresarial do Estado. Que tipo de informações foram solicitadas pelos sindicatos e que informações foram passadas?
"Aqui destaca-se como os sindicatos estão cientes do processo de privatização da CV Handling, pois, reconhecem que a Empresa foi criada para assim que as condições económicas, financeiras, técnicas e operacionais estivessem asseguradas, para esta ser privatizada. Deste modo, informaram-nos em como não são contra a privatização. As preocupações prendem-se, sobretudo, com a disponibilização de informações atempadas e, que neste processo, seja garantido que todos os direitos dos trabalhadores serão salvaguardados. O Governo assume os sindicatos como sendo parceiros neste processo de reforma do Sector Público Empresarial do Estado e, é neste quadro que o Executivo chegou a acordo “sobre princípios, políticas e medidas a implementar durante a vigência do Acordo de Concertação Estratégica para o horizonte 2024 - 2026, nomeadamente sobre políticas de crescimento económico sustentável e resiliência, política laboral, políticas activas de emprego e de empregabilidade, de rendimentos e preços, de protecção e de inclusão social. Informamos que sendo Cabo Verde um Estado de Direito Democrático, os direitos dos trabalhadores serão salvaguardados nos termos da Lei."
Cabo Verde teve na década de 90 boas privatizações, segundo alguns economistas, mas há alguns casos que não foram bem sucedidos. Como é que o Estado está a acautelar para que a privatização da CV Handling seja um sucesso?
"Destaca-se que o processo de privatização da CV Handling foi planeado de forma a assegurar a transparência, a aplicação da lei e das melhores práticas internacionais e a boa governança. Tem por base a lei que define o quadro geral de privatização de empresas públicas e de participações públicas. Trata-se de um quadro legal que se encontra em vigor desde 1992, tendo sido a base de trabalho do Governo naquela altura, mas também durante os anos 2000, até aos dias de hoje. Ou seja, é um quadro consensual, robusto e que protege o interesse nacional. Igualmente, um quadro legal específico com os termos e condições de privatização da Empresa. Uma avaliação independente da Empresa, como referencial mínimo neste processo negocial, com perspectiva de garantir que o processo venha a ser concluído por um valor muito superior, salvaguardando assim o interesse público. Com a privatização procura-se um parceiro estratégico com a experiência técnica e de gestão no sector da aviação, designadamente, de assistência em escala ou handling e no sector dos transportes; idoneidade e capacidade financeira; e com perspectiva de investimento estável e de longo prazo, com vista ao desenvolvimento estratégico da CV Handling. Levar-se-á em conta requisitos mínimos a nível de capacidade técnica, bem como a capacidade financeira. Na certificação técnica tem em conta a certificação/licença para prestação de serviços de assistência em escala, experiência na actividade aeroportuária, em particular na assistência em escala em três aeroportos, nos últimos cinco anos e assistência de, pelo menos, 15 milhões passageiros, anualmente, nos últimos três anos e; em termos de capacidade financeira é tido em conta o rácio solvabilidade (capacidade de honrar compromissos de médio/longo prazo). Destaca-se aqui sobretudo, o procedimento por concurso limitado, que compreende uma fase de manifestação de interesse para a aferição de potenciais interessados através de questionário (identificação dos interessados, certificação de operador do sector aeroportuário e demonstração de solidez económico-financeira dos interessados)."
O Governo quer reduzir a presença do Estado em 9 empresas públicas, através da agenda de privatizações, concessões e parcerias público-privadas, processos que devem ser concluídos até o final do primeiro semestre do próximo ano. É uma meta ambiciosa e atingível?
"Efectivamente, trata-se de uma meta ambiciosa, mas exequível. A curva de experiência permite-nos agora acelerar. Com a crise pandémica, vários processos que estavam em fase avançada, tiveram que ser revistos para a incorporação de pressupostos associados à crise. À presente data, para todos os processos já garantimos “Transaction Advisory” que apoia o Governo na definição da melhor estratégica, avaliação de activos e negócios para o apuramento do valor da Empresa e já lançamos Caixa, CV Handling e daqui a uma semana estaremos a lançar o processo de subconcessão dos serviços portuários. Acreditamos que para o horizonte que o Governo tem para materializar estas reformas, a equipa técnica, salvaguardando potenciais riscos, estará a garantir total cumprimento."