Pedro Pires, ex Presidente cabo-verdiano, enfatiza a importância do Brasil e do G20

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RFI Português
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Encerra o hoje a reunião dos chefes da diplomacia do G20 no Brasil. A União africana marca presença enquanto membro do G20 e Portugal e Angola, foram convidados como países observadores. O antigo Presidente de Cabo Verde, Pedro Pires, analisa o evento como uma oportunidade para emeger uma diplomacia diferente a nível mundial, mais equilibrada, liderada pelo Brasil. 

Pedro Pires, presidente de Cabo Verde entre 2001 e 2011, partilha com a RFI a sua leitura sobre a cimeira dos ministros dos negócios estrangeiros no âmbito do G20 que acaba esta quinta-feira, no rio de Janeiro no Brasil.

RFI: Qual é a sua opinião sobre a importância da União Africana se ter juntado ao bloco do G20?

Presidente Pedro Pires: Eu entendo que a implicação é mais ampla, do ponto de vista político, diplomático e económico. Em relação aos conflitos [em África], não temos o único conflito da República Democrática do Congo, há mais conflitos, no norte de Moçambique, há conflitos alguns sérios aqui na África Ocidental. Portanto, abrangeria certamente os vários conflitos, nas várias regiões africanas.

De toda a maneira, estar presente na reunião do G20, tem seu significado, podemos perguntar se isso significa uma melhoria da posição política em relação à África . A África ganhou novo estatuto, está mais presente. O resultado depende do trabalho feito, da atitude, da intervenção da União africana e dos Estados africanos.

E acha que a União África consegue representar os 54 Estados que a compõem, com toda a diversidade que isto implica?

Poderá representar se houver uma política da coordenação. Isto quer dizer, antes de as reuniões do G20, se houver uma coordenação entre os vários Estados, entre os vários governos, entre os vários ministérios. Tudo depende da metodologia de trabalho e da abordagem política.

Também queria ter a opinião do Senhor Presidente sobre o facto de esta cimeira ter lugar no Brasil, um país lusófono, com convites a Angola e a Portugal. Qual é a sua opinião sobre as prioridades de Brasília que aposta no mundo mais multilateral?

O facto da conferência se realizar no Brasil é importante. O Brasil não é um país do primeiro mundo se posso dizer assim, mas um país emergente.  Hà emergência de novos actores politícos internacionais no Brasil sob a liderança do presidente Lula da Silva que é um actor internacional importante, activo e com ideias claras sobre os interesses fundamentais dos povos dos países menos desenvolvidos, dos países que, na verdade, são dependentes.

O esforço do Brasil vai num sentido da participação na construção de uma nova ordem internacional mais democrática, mais justa e mais cooperativa e que tenha em conta todos os interesses, não só os interesses das grandes economias, dos grandes países mais interesses do países menos poderosos, mais pequenos.

O presidente brasileiro Lula falou em genocídio para definir o que está a ocorrer na Faixa de Gaza, comparando a acção do Estado hebreu com o nazismo. Lula da Silva é agora a persona non grata em Israel. Que diálogo pode existir entre as diplomacias do Brasil e dos Estados Unidos, primeiro aliado de Israel? Em que medida que o Brasil não está fragilizado na sequência deste braço do ferro com Israel?

Não sei se estará fragilizado. O problema é que há alguns que não criticam o que está acontecendo. É justo o que está acontecendo com o povo palestino? É justo, este massacre? O que significa a destruição sistemática duma população ou pelos menos de elementos desta população indefesa? Será que a posição do mundo ocidental é a posição mais justa? Eu acho que não.

Porque o que acontece hoje em Israel é por incoerência da política do mundo ocidental.

Acha que o G20 pode ser um contrapeso ao G7? E de que vale discutir no G20 dos assuntos internacionais quando se sabe que os dossiers ficam bloqueados pelo veto dos membros do Conselho de segurança da ONU, como é o caso da Rússia e da China?

… E dos Estados Unidos, claro! E da França também, e do Reino Unido também… O direito do veto é não apenas reservado à Rússia ou à China! Esses países, defendem os seus interesses. Do nosso ponto de vista, é precisa ver se o que herdamos da Segunda Guerra Mundial é ainda actual. O que é que se deve mudar? Eu não lhe posso dizer o que é que se deve mudar. Agora, que se deve mudar alguma coisa, sim.

Em relação à presença de Angola que foi convidada a esta cimeira, acha que Angola pode ter um papel?

Eu, actualmente, estou na reforma, não sou um actor político em função. Mas eu acredito que Angola pode ter um papel importante. As lideranças angolanas devem ter plena consciência do seu papel. E sobretudo, na sua região, isto é, na África austral, eventualmente na África Central. Angola para isso tem que pôr em ordem a sua economia, fortalecer a sua democracia. Esse é a esperança dos Africanos.